Esperança no ar; mobilização rende 21 mil assinaturas contra corte de árvores
A maritaca Esperança, que se tornou símbolo do Movimento Preserva Ilhéus, foi solta na natureza neste domingo nas proximidades de Olivença. Para evitar que o animal se acostumasse com a gaiola em que foi tratada e não conseguisse mais voar, foi preciso acelerar o teste de vôo, após uma avaliação médica positiva. Se Esperança tivesse se acomodado ao cativeiro, precisaria de um viveiro maior e seria encaminhada a um santuário de aves. Mas tudo deu certo e desde ontem ela está de volta ao seu habitat natural
Após a derrubada das amendoeiras na Avenida Soares Lopes, pelo menos cinco maritacas foram encontradas mortas. Porém uma foi achada no local ainda com vida no dia 15/07, bastante debilitada, apática e com as asas abertas no chão. A maritaca, que recebeu o nome de Esperança, foi resgatada quase morta e entregue para professora Flávia Costa e Carlos Audy. Eles deram os primeiros socorros e ela foi reanimada, empoleirou no potinho de água dentro da caixa em que foi colocada.
Na manhã seguinte, dia 16, foi feita a tentativa de libertação, mas ela não voou. Tinha comido pouca banana e alguns grãos. À tarde foi levada para Clínica Médica Veterinária para Raio X Atendida por Dra. Andrea Guimarães e Prof. Dra. Flávia Miranda da Uesc, que constataram uma luxação no ombro e no pescoço . O animal estava bem “amuado” e quieto. Foi colocado na UTI com oxigênio, recebeu antibiótico , alimentação específica de papagaio e remédios para dor. A ave também apresentava problema respiratório e havia suspeita de pneumonia.
A partir daí, a avaliação médica era de que com a melhora das condições de saúde, Esperança precisava voltar para casa e rápido. E este retorno do animal foi uma vitória, porque o tratamento veterinário de aves é muito difícil.
Entenda o caso
No último dia 7 de Julho de 2020, a prefeitura da Ilhéus/Ba derrubou várias árvores ao longo da Avenida Soares Lopes, uma das mais tradicionais da cidade, e impactou severamente as aves da região, que ficaram desnorteadas após perderem seu local de pouso e abrigo. A ação imediata de moradores impediu que a derrubada fosse maior.
As árvores derrubadas eram da espécie Amygdalus Communis, popularmente conhecida como amendoeira. O impacto na flora foi imediato também na fauna. No mesmo dia, moradores da avenida registraram fotos e vídeos mostrando uma grande revoada de maritacas na busca por um local de pouso no fim de tarde. Sem descanso, nem abrigo, as aves chegaram às varandas de apartamentos próximos e despertaram o sentimento de inconformidade da população. Dias depois algumas maritacas chegaram a aparecer mortas.
O repúdio da comunidade ilheense à derrubada das árvores e a falta de um plano de manejo para as aves desabrigadas foi o que motivou a cobrança do Ministério Público estadual sobre a legitimidade da ação. A Promotoria Regional de Meio Ambiente instaurou desde o dia 16 de julho um procedimento preparatório de inquérito civil e semana passada recebeu informações da Secretaria Municipal de Meio Ambiente sobre o processo supressão das amendoeiras. O caso continua em andamento.
Mobilização Social
À frente de toda a articulação social está o Movimento Preserva Ilhéus, que reúne representantes da sociedade civil organizada, ambientalistas, redes de empreendedores e diversos atores sociais em torno da pauta. O Preserva Ilhéus está organizado para gerar, compilar e divulgar o material informativo, que circula nas redes sobre o caso, assim como a juntada de documentos para o MP e a mobilização social em todo Brasil. O Movimento atua com grupos de trabalho nas áreas jurídica, de comunicação, técnico-científico, mobilidade e urbanismo e ativos ambientais.
O Movimento Preserva Ilhéus circulou uma Petição Online na internet, que hoje tem mais de 21 mil assinaturas, exigindo que não sejam derrubadas mais árvores e que fique estabelecido o plantio de espécies nativas da Mata Atlântica, assim como a apresentação de um plano de mobilidade e urbanismo que contemple a sustentabilidade socioambiental para Ilhéus. A Petição foi protocolada na Prefeitura no dia 17 de Julho. O Prefeito chegou a marcar uma reunião com o Preserva Ilhéus para as 16h do dia 20, mas infelizmente não compareceu. O Coletivo continua aguardando a remarcação da reunião oficial acreditando ser o local e momento ideais para ouvir o plano do município e colaborar ativamente para a construção de uma cidade com políticas públicas cada vez mais sustentáveis.
Projeto não previa derrubada
E o Movimento Preserva Ilhéus teve uma grande surpresa no dia 23, quando teve acesso ao Processo Administrativo 733/2018, junto à Secretaria Municipal de Meio Ambiente, no qual consta a solicitação da empreiteira OAS Engenharia e Construção de autorização ambiental para o corte das árvores que interferiam no traçado do sistema viário norte e sul da Ponte Ilhéus - Pontal - BA001.
Após análise detalhada do inventário florestal e florístico sobre as árvores que seriam afetadas pelos acessos viários à nova ponte, assim como pela observação da planta baixa do projeto e dos registros fotográficos, ficou evidente que as amendoeiras cortadas no dia 07 de julho não estavam incluídas nem no plano de supressão nem na autorização ambiental expedida.
A análise visual do mapa integrante do Projeto de Geometria demonstra que as árvores suprimidas não estão localizadas dentro da poligonal que marca detalhadamente os indivíduos a serem cortados. Essa evidência confronta as declarações do Secretário Mozart Aragão dadas ao jornal Cabrália no Ar, veiculado no dia 12 de julho, momento em que afirma que “essa retirada foi em virtude dos acessos viários da ponte. Os acessos viários não podem ter nenhum tipo de vegetação... Esses serviços foram solicitados dentro da licença ambiental da ponte... Então está tudo autorizado, tudo devidamente autorizado, tudo ocorreu conforme a legislação permite.” Outra declaração foi dada ao jornal BATV do dia 14 de julho, de que “a própria licença ambiental da construção da ponte e do sistema viário exigiu essa retirada dessas árvores que estão no sistema viário”.
A luta pelas Maritacas foi o despertar para a consciência ambiental em Ilhéus. O meio ambiente da cidade, se bem cuidado é capaz de atrair muitos investimentos e gerar emprego. O turismo, o comércio, a agricultura, o transporte, e todas as relações que criamos dentro da comunidade ganham muito quando o meio ambiente é preservado.
Além dos impactos negativos que o corte das amendoeiras impuseram às aves, o coletivo passou a questionar sobre muitas outras demandas, como sobre a necessidade de um Plano Municipal de Arborização, da implantação definitiva da coleta seletiva, combater a poluição dos rios que cortam a cidade e a invasão de espaços públicos com construções irregulares, a implementação do Projeto Burle Marx, entre tantos outros assuntos, todos muito relevantes para o verdadeiro progresso da região. Um progresso que consiga unir, verdadeiramente, desenvolvimento econômico com preservação ambiental, participando efetivamente toda a comunidade.